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Entrevista com Ruy Moreira: Como a Geografia Entende a Natureza.


Entrevista concedida no dia 16 de abril de 2015, na Universidade Federal Fluminense com o intuito de levantar subsídios para a produção do relatório final de iniciação científica CEPE: "O que a Geografia Física entende por natureza: análise e aplicabilidade das proposições de Ruy Moreira sobre a concepção de natureza em Geografia", realizada pelo aluno bolsista Willians Carvlho Niz, Orientador Professor Doutor Douglas Santos e Coorientador Professor Doutor Mauro Peron, fomentada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. A discussão se baseou no trabalho "A Insensível Natureza Sensível", do geógrafo entrevistado, Ruy Moreira.

Ressalto que, infelizmente, alguns erros de digitação acabaram passando, e há uma pequena falta de sincronia entre o vídeo e o áudio em alguns trechos da entrevista.

Como a Geografia Entende a Natureza A crítica que é feita na iniciação científica, ainda em andamento, baseia-se na ideia de que tanto a natureza na Geografia, quanto na Física Clássica, tratam do mesmo conceito, isto é, a natureza na geografia é o mesmo empregado na física, e o motivo de adotarmos tal pensamento sobre a natureza é o que gera toda a discussão de Ruy Moreira sobre isso.


O conceito é aquele discutido na entrevista: "um conjunto de corpos matematicamente ordenados pelos movimentos mecânicos da Lei da Gravidade", ou ainda na nova edição do Discurso do Avesso, "um conjunto de corpos ordenados pelos movimentos mecânicos da Lei da Matemática". O conceito diz respeito ao emprego do discurso matemático para a formação do discurso científico da geografia sobre a natureza, que se realiza na redução de seu conceito na lei da gravidade e se fundamenta na matemática.


O problema não está necessariamente na adoção deste conceito, mas está na sua falta de aplicação dentro do pensamento contemporâneo e na redução da natureza para a finalidade dela servir, único e exclusivamente, à economia, que por sua vez, entra como a culminância do modelo Natureza-Homem-Economia, que resumo à estrutura do pensamento moderno da Geografia. Não pensamos a natureza para uma geografia que idealizamos, mas uma geografia econômica que estamos construíndo.

Outro problema diz respeito à redução do próprio conceito da Física, que já se superou no salto qualitativo da física moderna pra física quântica. A Geografia emprega o conceito da Física Clássica, sendo que a própria Física já se superou faz muito tempo.



Geógrafas e geógrafos diante da engenharia espacialmente arrumada

Muitas vezes geógrafas e geógrafos dividem o ambiente de trabalho com as engenharias florestais, ambientais, agrônomos, entre outras especificações. Considerando a engenharia com uma profissão bem distinta da nossa, temos que lidar uma diferente visão sobre o espaço geográfico.

A entrevista inicia com a explicação que Ruy Moreira dá sobre o sistema NHE (Natureza, Homem e Economia), referente ao texto "A insensível natureza sensível" (primeiro capítulo de seu livro O Círculo e a Espiral), que é uma crítica da redução da natureza e a Geografia Física ao circuito da economia e como, também, uma forma de engenharia. Ele complementa que quando profissionais da Geografia Física não analisam o aspecto "fisiográfico do espaço" e da paisagem para explicar por onde a atividade econômica se torna rentável, eles a reduzem à uma Geografia Econômica e transforma a leitura da natureza numa combinação de recursos econômicos e infraestrutura.


A utilização da palavra insensível refere-se ao modo que profissionais da Geografia encaram esses arranjos geográficos nos arranjos dos circuitos da economia, o qual deve ser encarado de forma mais profunda, considerando a "hominização do homem pelo próprio homem", ou seja seu trabalho sobre a natureza modifica sua própria natureza.



A natureza na geografia escolar


Considerando o mesmo conceito para Geografia e para a Física Clássica de Newton, o discurso de natureza entra na construção do conceito e dos métodos da própria Geografia independente da sua finalidade, seja para rentabilidade de uma empresa, para a engenharia ou para uma Geografia Escolar. A crítica de Ruy Moreira é ainda sobre o reducionismo da leitura de natureza newtoniana e cartesiana para uma leitura economicista na qual trabalhamos, inclusive na Geografia escolar. A discussão da "insensível natureza sensível" foi discutida pela primeira vez no contexto escolar na primeira edição do O Discurso do Avesso. Para Ruy Moreira a "Geografia está muito mais na cabeça do professor da Geografia Escolar do que na cabeça do professor da Geografia Universitária".


"Na escola, na Geografia Escolar, o NHE acaba se tornando presente porque o professor é um só sujeito na relação com os alunos de dialogar com o mundo através do ensino da Geografia. E ele precisa ter o conhecimento de 'todas as partes' da Geografia que ele apresenta como gavetas num armário, mas que ele é o armário inteiro, que ele vai falar em sala. Já o professor universitário é completamente ausente de tudo isso."

Não é só a natureza que aparece de forma diferente no discurso escolar e no discurso universitário, mas todo o modelo N-H-E. O professor da escola, mesmo com o modelo NHE totalmente baseado numa razão fragmentária, é obrigado a passar todo seu sistema para os alunos: a natureza, depois o homem, e a economia no final. Já na universidade, como são muitos professores e cada um apresenta a geografia segundo sua especificidade (ou especialidade), o discurso se fragmenta de tal forma que a própria Geografia se perde neste discurso do professor, e ele não é obrigado a passar o todo, mesmo o fragmentado e desatualizado discurso pautado no modelo do NHE.


Já na fase do formato clássico dos livros didáticos brasileiros, Ruy Moreira exemplifica que Aroldo de Azevedo convidava através dos livros os professores a realizar esse enlace das fragmentações da Geografia como uma visão do mundo de pluralidade, destacando que o modo desse enlace varia de um tempo pro outro. A finalidade da Geografia na época de Aroldo de Azevedo "era formar e não informar", o que acontece o contrário hoje. Sendo que informar é reproduzir na sala o que é dito na televisão, que não são discursos espaciais. Desse modo, atualmente, não é possível distinguir um texto de livros didáticos hoje com textos jornalísticos, deixando a epistemologia de lado.



A GEOGRAFIA E SUAS GEOGRAFIAS


As consequências do que pensamos sobre a natureza na Geografia, na própria ciência geográfica, seriam múltiplas: fragmentamos todo o pensamento geográfico; perdemos campos de estudo para ciências vizinhas, como a geologia, biologia e a meteorologia; excluímos o orgânico e o vivo da natureza, interpretando ela mesma como uma natureza morta (apenas regido pelos movimentos mecânicos da gravidade); e reduzimos a própria Geografia a uma geografia econômica, baseando os estudos da geografia física apenas para subsídios e auxílio para as muitas Engenharias que existem, isto é, as geógrafas e geógrafos servem à Economia, indiretamente, e à Engenharia diretamente, no campo profissional do bacharel.


Ruy Moreira destaca a dificuldade de nós, dentro desse cenário econômico, encontrarmos uma forma de sermos geógrafas e geógrafos com nossas especialidades dentro da própria Geografia, mas sem perder a dimensão geográfica, apontando a diferença entre da especialização da fragmentação, pois a primeira não perde a visão do todo. Diante disso pode-se dizer que a universidade não tem mais a dimensão crítica e incorporamos uma postura muito mais técnica.


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